domingo, 12 de novembro de 2006

In nomine esclarecimentus (ou coisa do género)

Caríssimo Bispo de Angra e Ilhas dos Açores (é assim que se diz, não é?)

Serve a presente posta para acusar a recepção da sua missiva, que surgiu na minha caixa de correio nesta semana que passou, embora viesse sem destinatário, o que me leva a pensar em publicidade (neste caso, religiosa) não endereçada, daquelas que se tivermos o autocolantezito amarelo na dita cuja, não entraria pela ranhura postal, por ser expressamente proibido.
Posto este esclarecimento, sou a dizer-lhe que folgo ver que a Igreja começa finalmente a prestar algumas contas aos ditos fiéis, embora também seja forçado a dizer-lhe que perante os números apresentados, os católicos ficarão praticamente na mesma.
A retirar da leitura dos números divulgados, a Igreja ou é má gestora, ou já não sabe “vender” o seu “produto”, por estar ultrapassada nas formas de comunicação e marketing.
Eu aposto numa mistura das duas.
A Diocese de Angra acabou por dar prejuízo em 2005 no valor de 143.627,44 €.
Convinha realmente que o saldo final fosse 0 €. 30 mil contos de prejuízo é muito prejuízo junto.
De qualquer forma, embora não tenham conseguido equilibrar as contas, folgo em saber que a Igreja não seguiu o exemplo do Governo Regional, que deu lucro e orgulhou-se de tal facto, na praça pública.
É que um governo dar lucro, já é mau, sendo muito pior um governo dar lucro numa região com tanto problema e tanta carência.
Mas adiante, que não é do governo que lhe quero falar:
Vejo nos dados que inclui no folheto que me enviou (devidamente envelopado) que o contributo dos fiéis (e não fieis, como erradamente escreve no folheto*) chegou e sobrou para pagar os salários e a segurança social da diocese. Isso é bom.
Agora, o que me baralhou na coluna das receitas, é a divisão entre “contributo dos Fieis (Percentagem das Paróquias), Colectas e Receitas Diversas e Donativos. Eu, leigo em matéria de contas, com humildade pergunto: isto não vem tudo do mesmo sítio, ou seja, dos bolsos dos açorianos?
E posto isto, chegamos onde ao que queria desde o início:
Depois das contas, da explicação acerca do que é a Diocese de Angra, e da Oração pela igreja diocesana (confesso que desconhecia, sempre pensei que era a Igreja a rezar por nós e não nós a rezar pela Igreja), deparei-me com o pedido de “Colaboração Responsável”.
Sr. Bispo, cá para a gente, que ninguém nos lê, ambos sabemos que a vida não está fácil, nem para fiel, nem para ateu, nem para agnóstico, nem para a Igreja, seja ela qual for, mas convenhamos: depois de 493.851,97 € (mais de 99 mil contos) desembolsados pelos açorianos (no Contributo dos Fieis (Percentagem das Paróquias), nas Colectas e nas Receitas Diversas e Donativos), a Diocese vem por meio de carta pedir uma “Colaboração Responsável”? Os 99 mil contos foram doados de forma irresponsável?
Sr. Bispo, a vida não está fácil para ninguém e a malta cá fora, quando não tem, pede, mas paga às prestações e com juros (elevadíssimos, estão pela hora da morte).
Sei e reconheço que a Igreja presta um serviço de grande valor à sociedade e não apenas aos fiéis, mas também lhe digo Sr. Bispo, que tal serviço já merecia uma actualizaçãozita, digamos que uma aproximação à sociedade actual, da qual considero que a Igreja está cada vez mais afastada, mesmo fazendo alguns esforços tímidos de aproximação.
Sr. Bispo, pouco tempo depois de receber a sua comunicação, dois putos tocaram à campainha da minha casa, a perguntar se eu não queria porventura contribuir para o pagamento dos sinos da Igreja de Santa Clara...
Numa sociedade cada vez mais assoberbada por falcatruas, corrupções várias e fraudes diversas, no mínimo espera-se que quem faz tais peditórios venha devidamente identificado e tenha idade para saber o que faz, explicar ao que vem, etc., etc..
É que, veja: não é só o Sr. Bispo ou a Diocese quem pede: é o Sr. Bispo pela Diocese, são as associações em defesa de tudo e mais alguma coisa (e que fazem também um trabalho meritório), umas sobejamente (re)conhecidas, outras nem por isso, são os bombeiros, são “n” instituições, muitas delas que desempenham realmente um trabalho fundamental em prol da sociedade.
Fora estes, há que lembrar aqueles que não pedem: cobram e não se fala mais nisso.
É o aumento da electricidade que a ERSE diz dever ser de 15% e logo vem o governo em acção pseudo-benevolente, dizer que não senhor, não pode ser, tem que ser menos senão o povo não aguenta, é o aumento dos combustíveis, que entre subidas e descidas, lá ficou (bem) mais caro, é aumento dos bens de consumo de primeira necessidade, é o aumento de tudo o que nos rodeia.
Ou seja, Sr. Bispo, não dá. É impossível dar para tudo. Por isso estabelecemos prioridades na nossa vida e é por essas prioridades que nos devemos reger.
Por isso lhe digo que nesta altura, a Igreja não é uma das minhas prioridades. Poderá vir a ser, nesta altura não é.
Depois (e embora reconheça que este texto já vai longo, ainda mais como resposta a uma carta não endereçada) tenho que lhe dizer ainda uma outra coisa: tal como tudo na vida, Sr. Bispo, onde existem bons jornalistas e maus jornalistas, bons médicos e maus médicos, bons e maus professores, também existem bons e maus padres. E entre os bons e os maus ainda há aqueles que sendo bons, preferem ir por maus caminhos, os do facilitismo, dos compadrios, das cunhas, do despesismo, etc., etc..
Espero pelo menos que as despesas em Formação, inscritas no folheto que me enviou com 190.707,11 €, tenha servido para atenuar e reduzir a quantidade de maus padres que existem nos Açores. É que também os há.
Deixo-lhe por fim a pergunta/sugestão: a Diocese controla e fiscaliza de forma eficaz as contas de todas as paróquias?
Sr. Bispo, quando comecei este texto, achei que ia escrever poucas linhas, mas a missiva já se estende por duas páginas de Verdana a tamanho 10.
Por isso, fico-me por aqui e reduzo-me perante a sua pessoa, à minha insignificância.
Cumprimentos

* fiéis -
plu. de fiel ou masc. plu. de fiel
do Lat. Fidele - adj. 2 gén., - que cumpre aquilo a que se obriga;
* fieis - 2ª pess. plu. pres. conj. de
fiar
do Lat. Filare - v. tr. e int., - reduzir a fio (os filamentos ou fibras têxteis); puxar à fieira (os metais); serrar pelo meio, longitudinalmente;

1 comentários:

Nuno Barata disse...

POr puro acaso é "excelência reverendissima", mas o que é que isso interessa se no conteudo a posta acerta mesmo na mosca.