quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Quereres

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão

Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói

Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus

O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim

Caetano Veloso

sábado, 18 de setembro de 2010

Deus é “isto”?

Que Deus temos nós, afinal, que não nos acode?

Deus é quem, o quê, serve quem e o quê e quando?

Que Deus é este, que deixa ou faz ou não se importa com os nossos, a família, os amigos, os próximos, os que nos dizem alguma (muita) coisa e que desaparecem assim de repente, como se nada fosse e não nos interessasse?

Quem é o gajo que manda nisto, afinal?

Que Deus é este que se lembra de dizer “ah, tu agora ficas com um cancro (cancro é, de todas as palavras, talvez (de certeza) a mais feia que eu escrevo, leio e ouço, de todas as palavras da língua portuguesa) porque apetece-me dar-t'uma coisa destas, até porque o stock é grande.?

Que raio (sim, claro, a pergunta, a estúpida pergunta que todos nós fazemos em surdina, para ninguém saber ou perceber ou ouvir que também nós pensamos nisto) fazemos nós neste mundo?

“Ah”, diz Deus, desenrasca-t'agora que tens um organismo todo marado.

Mas afinal que merda é esta?

Olha, Deus, tu... sim tu, é contigo que falo (já que dizem que estás em todo o lado), se por acaso leres isto, vai à merda, ok?

Lembro-me e apetece-me dizer-te o que se dizia na minha terra: “vai brincar com a pilinha prá areia”, em vez de brincares com a vida das pessoas.

É que as pessoas, até prova em contrário, só tem uma vida.

Já pensaste, sequer, em desmistificar isto?

Afinal, morrer é o quê?

“Opá, opá”, a sério, toma juízo: deixa de brincar connosco, ok?

Afinal, qual é a tua ideia? Toma juízo, ok?

É que nós não andamos propriamente aqui a brincar com a vida, como se tivéssemos 7.

Julgas tu o quê, afinal?

(desculpa lá, mas tratar-te por “tu” não é (para mim) depreciar-te, ok?)

(poupa-me...)

Parvoniocracia

Sinceramente, eu não consigo perceber a atitude da “massa crítica” deste país.

A sério, não consigo.

Este país está de rastos, literalmente.

O problema está diagnosticado há muitos governos. Não é de agora. A despesa pública é o cancro deste país. Estamos todos de acordo.

Também estaremos (acho eu) de acordo quando se diz que não há governo PS ou PSD que consiga, por mais que “ameace”, reduzir essa despesa pública, portanto, o problema não é da cor: é da incapacidade geral.

Isto dito assim, de forma tão abstracta como esta, até parece inofensivo.

Mas quando me dizem e redizem que a cada hora que passa, o estado gasta 2,5 ME, as coisas passam do abstracto ao ordinário. Ao obsceno.

Governo após governo, seja laranja, seja rosa, seja uma mistura como faz ali na Avenida, o Tomé no seu quiosque (com os gelados), estamos sempre mais ou menos ao nível do quase afogamento.

Admirem-se que, um dia destes, os portugueses, que já foram emigrantes à força toda e que depois se tornaram receptores de imigrantes sem saber como, admirem-se, dizia eu, que este país, assim de repente, este povo, que tem aturado a maluqueira destes dois maiores partidos que têm formado governo, admirem-se, insisto, que o povo, o tal que “é sábio” na altura das eleições mas que no resto do ano é considerado burro, comece a desaparecer e a emigrar para outras paragens.

A sério.

É que “andamos” para aqui ocupados com assuntos menores, como revisões constitucionais com propostas que afinal é melhor não existirem, com seleccionadores temporários para o futebol nacional e para coisas do género e depois passam os dias e andamos para aqui pseudo-ocupados com o acessório, enquanto o essencial nos escapa. Parece propositado. E eu não acho piada nenhuma ao “entretenimento” que a comunicação social nacional tem feito, quando deveria estar a produzir notícias. Notícias a sério. A put@ da sillly season prolongou-se demais, este ano. E parece que continua por aí.

Só espero que não nos tornemos todos silly, acabando por fazer do ano inteiro, uma única season.

(Qualquer dia emigro)

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Ironias da publicidade automática


O problema dos anúncios automáticos, do género "Google Ads" ou, neste caso do "Anúncios Sapo", é que, lá de vez em quando, gera situações caricatas.



Com "Deus" ou com 'o' "Diabo"?

Não sei bem porquê (a gente nunca sabe muito bem porquê, estas coisas, não é?), dei comigo a pensar num(a) meu conhecido(a) que faz tudo o que pode para estar bem com Deus e com o Diabo.

Ao mesmo tempo.

Daquelas pessoas que pela frente são muito “amigos” mas que virada a esquina, desbobinam uma série de críticas e impropérios sobre nós.

Daquelas pessoas que vivem das aparências e do alarido que fazem, porque fica bem, parecer bem e fica bonito e dá nas vistas e causa imensa inveja, acham. E depois, é só superficialidade. E depois, para lá das aparências não há nada.

Ou melhor, há.

Há o que tentam disfarçar através da teatralidade do dia-a-dia, porque o que vivem na realidade é mau demais.

Há que inventar uma “realidade” diferente. E mostrá-la. Fazer tudo para mostrá-la.

E a ânsia de mostrar essa tal de “realidade” inventada é tão grande, mas tão grande, que quem vive assim, esquece-se de algumas coisas extremamente importantes.

Esquece-se, por exemplo que, quer Deus, quer o Diabo (porque é que Deus é Deus e “o” Diabo é “o” Diabo?) têm amigos.

E como qualquer outro ser com facebook por exemplo, têm amigos em comum.

E vai daí, os amigos comuns de “Deus” e do “Diabo” falam entre eles.

E claro, desses amigos comuns, alguns são sempre, para além de amigos de “Deus” e do “Diabo”, amigos de quem é visado nas conversas deste tipo de gente.

E acabamos sempre por saber, pelos amigos comuns, que um(a) tal conhecido(a) diz/disse/vai continuar a dizer barbaridades acerca de nós próprios.

Não sei se é por maldade, acredito que seja mesmo mais por ingenuidade. Por vezes até, acho que os comentários jocosos e as bocas não são ditas por maldade, mas por necessidade de ter o que dizer.

De qualquer forma, essa gente é fácil demais de desmascarar. E não dá sequer “tusa” de confrontar/contrariar.

É gente tão fraca de espírito.

E depois de escrever isto tudo, que é tão pouco, dei comigo a pensar em mais meia dúzia de conhecidos(as) do género.

Não passam (nunca passarão) de “conhecidos”.

Eu cá (e lá) prefiro que “Deus” ou 'o' “Diabo” saibam de antemão que não simpatizo propriamente com um deles.

Não é preciso estar bem com “Deus” e com 'o' “Diabo”.

Nunca foi.

E estar, dá asneira.

domingo, 5 de setembro de 2010

Não sou grande adepto...

...de poesia.

Mas há poemas que ficam. E por vezes ficam mesmo muitos anos.
Este ficou por cá.
É só uma letra dos Heroes del Silencio. Nada mais. A música chama-se "Con nombre de guerra"

entra despacio,
que nadie oiga tus pasos.
mientras tanto
si los nervios no traicionan, todo irá bien
y dejemos los besos para los enamorados
y pensemos en lo nuestro,
que por eso te he pagado
aunque esta noche...
seas sólo mercancía para mí.

dejo en tus manos
lo que hemos acordado
la lluvia de hace un rato
ahora sólo necesito descansar.
y dejemos que los sueños
se apoderen del deseo
recordemos que lo nuestro
se me olvidará al momento
aunque esta noche...
sea sólo unos billetes para ti.

pienso en los años
que llevas guerreando
con un nombre por bandera
ahora sólo quiero oírlo una vez más.
y dejemos que lo cierto
sea lo que imaginamos
recordemos que lo nuestro
todavía no ha acabado
aunque, por esta noche, ...
...por esta noche...
nos podemos despedir